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segunda-feira, dezembro 17, 2012

Suportes que ele não suporta

Um bom indicador do envelhecimento é a incapacidade para ser, no mínimo, tolerante com o novo, mesmo que não o entendamos completamente ou não nos consigamos adaptar a ele.

Essa é uma das razões por que a entrevista que Vargas Liosa dá ao Ípsilon da passada sexta-feira é tão deprimente.
Apocalíptico em sentido lato, reserva para si e para a literatura o papel de  salvadores do pensamento e da escrita, mas apenas, e repito APENAS, no formato de livro.

Llosa afirma : se os tablets e os ecrãs roubarem todo o protagonismo ao livro, assistiremos a um extraordinário empobrecimento da linguagem, haverá uma deterioração da comunicação e da racionalidade, as máquinas passarão a pensar por nossa conta e isso poderá trazer consequências gravíssimas, nomeadamente o desaparecimento da liberdade”.

Um susto, estas afirmações (reiteradas), vindas dum Nobel da Literatura que só tem 76 anos.

No que me diz respeito, gosto de livros. Gosto mesmo muito. E, apesar de reconhecer o prazer quase sensual de os manusear, cheirar etc. não fujo do digital como o diabo foge da cruz. Há livros que quero ter fisicamente ao pé de mim. Sempre. Esses, quero-os em papel. Há muitos outros que leio e esqueço. São os que podem vir em suporte digital − um dia vou apagá-los para dar lugar a outros. Esta mania de que as coisas não podem coexistir, nunca a entendi, até porque o passar do tempo nos vai mostrando que é o contrário que é verdadeiro.

Vargas Llosa ficou, precocemente, velho.
Compare-se a sua postura face ao ecrã com a da minha mãe, que no dia dos seus 86 anos recebeu livros, mas também foi à internet descobrir um truque para fazer crescer as farófias.
Quem é mais novo, quem é?
E, já agora, quem parece mais inteligente e disponível para a vida?

PS: sobre o mesmo assunto, recomendo o post de Rui Bebiano no seu blog A Terceira Noite

sexta-feira, maio 06, 2011

O intelectual e os macacos

“Os jovens que abreviam palavras nas redes sociais e nos SMS pensam como macacos”, palavras de Vargas Llosa, Prémio Nobel da Literatura 2010.
Esta frase é pura bruteza, mas, não contente com ela, acrescenta ainda algumas alarvidades sobre os humanos que para ele são símios.
É patético, como patética é a velhice precoce de muitos intelectuais na casa dos 60 ou 70, cheios de nostalgia pela literatura que já não há, pela escrita que já não é, pelos “valores” que já foram.
Passam o tempo dizer que ninguém lê e ninguém escreve, o que é absolutamente falso; se ninguém lesse não se publicavam tantos livros e nem se vivia da literatura, como me parece ser o caso de Lhosa. Quanto à escrita, há 15 anos atrás, por exemplo, ninguém escrevia, só se telefonava. O email, o SMS, o Facebook, o Twitter, trouxeram a escrita de volta à nossa vida em todas as idades e em todas as línguas.
Escreve-se de maneira diferente? Sem dúvida. A língua é algo vivo, seja escrita ou falada, vai mudando com o tempo e com os seus utilizadores.
Estes filhos dum deus maior não são só patéticos, são também snobes. Repetem mil vezes que dantes é que se escrevia bem, e eu digo que dantes ALGUNS, e apenas ALGUNS, escreviam bem; os outros todos não escreviam nada porque nem sequer foram à escola. Agarrados aos seus privilégios de intelectuais julgam que os outros pensam como macacos apenas porque têm a ousadia de pensar como quiserem (ou de não pensarem de todo).
Choram o fim da boa literatura e da boa escrita, engolidas pela rede e pelo digital mas não reparam, talvez porque só olham para o umbigo, que continua a haver muito boa escrita feita por gente com metade da idade deles.
Também não repararam que a rádio não matou os livros nem os jornais, a televisão não matou a rádio e a internet não matou a televisão. Ao contrário, de todos nos fomos apropriando com grande proveito. Com estes meios, o conhecimento (mas não a cultura) está ao alcance de qualquer um, o que parece desagradar-lhes.
Sempre haverá literatura, e pintura, e escultura, arte em geral e música, embora com formas diferentes, porque isso faz parte do património humano. Sempre haverá quem escreva bem e haverá muitos mais que escreverão mal mas, felizmente, ao menos escrevem. E não são macacos. São apenas pessoas que os intelectuais desprezam.
Um intelectual devia ser alguém estimulante mas, demasiadas vezes, não o é. A arrogância e mania da superioridade colam-se-lhes à pele como uma indumentária que lhes fica tão mal que às vezes até parecem palhaços. Mas nunca macacos.