A Sérvia, fatia europeia aqui tão perto, continua a ser para nós um país desconhecido. Sabemos que quer entrar na UE, sabemos que lhe foram impostas condições para o conseguir, e que uma delas é a entrega ao tribunal de Haia dos criminosos da guerra dos Balcãs no início dos anos 1990 do século passado.
Têm sido difíceis de apanhar, certamente porque têm estado protegidos por muitos milhares de sérvios e, talvez até, pelos vários governos.
Asne Seierstad, jornalista norueguesa, fez várias viagens à Sérvia, falou com sérvios de toda a espécie e publicou um livro que em português se chama “De Costas Viradas para o Mundo” (Ed. Pedra da Lua, 2008).
No prefácio, redigido em 2004, ela escreve:
Desde que o tribunal para crimes de guerra na antiga Jugoslávia se formou, em 1993, que constituí para muita gente uma questão delicada. O tribunal foi criado, em grande medida, porque os Estados que antes constituíam a Jugoslávia ou não eram capazes ou não estavam dispostos a julgar os seus criminosos de guerra. Pelo contrário, muitas vezes os acusados eram apresentados e homenageados como heróis. Isto acontecia na Croácia, na Bósnia e, com toda a certeza, na Sérvia.
…A síndrome da vitimização é, nos Balcãs, como um denso e impenetrável nevoeiro.
…
Contrariar os esforços do tribunal tornou-se uma forma de mostrar patriotismo. “Porquê nós? Porquê nós?”, perguntava a população na Sérvia, na Croácia e na Bósnia. “Foram os outros que atacaram, nós apenas nos defendemos”
A divisão entre os Sérvios que querem aderir à UE e os que se alimentam das grandezas do passado, que sonham com a “Grande Sérvia” e protegem os seus criminosos parece persistir até hoje. Desta vez ganharam os primeiros mas durante 17 anos os segundos deram mostras de serem numerosos e determinados.
Mladic é um monstro. Esperemos que se faça justiça.