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quinta-feira, janeiro 17, 2013

"Capitalista, sim, mas zen"

Blogues e Facebook estão pejados de portugueses entregues à filosofia zen, muito apetitosa para os tempos que correm – distanciamento, desapego, paz interior, e assim. Não resisto, por isso, a transcrever excertos dum, também muito apetitoso, texto do polémico filósofo esloveno Slavoj ZizeK − “Capitalista, sim, mas zen”, que retirei da internet em tradução brasileira (aqui)

 
“…No momento em que a tecnologia e o capitalismo “europeus” triunfam em escala planetária, a herança judaico-cristã, como “superestrutura ideológica” parece ameaçada pelo assalto do pensamento “asiático” da Nova Era. O taoismo é adequado para se tornar a ideologia hegemónica do capitalismo mundial. Uma espécie de “budismo ocidental”, se apresenta hoje como remédio contra o stresse da dinâmica capitalista. Ele permitiria que nos desligássemos, que mantivéssemos a paz interior e a serenidade, e funcionaria, na realidade, como um perfeito complemento ideológico.
Solução escapista

As pessoas não são mais capazes de se adaptarem ao ritmo do progresso tecnológico e das transformações sociais que a acompanham. As coisas andam muito rápido. O recurso ao taoismo ou ao budismo oferece uma saída. Em vez de tentar se adaptar ao ritmo das transformações, é melhor renunciar e “deixar ir”, mantendo certa distância interior em relação a essa aceleração, que não diz respeito ao núcleo mais profundo de nosso ser. Estaríamos quase tentados a utilizar novamente, agora, o clichê marxista de religião como “ópio do povo”, como suplemento imaginário à miséria terrestre. O “budismo ocidental” aparece, dessa forma, como a maneira mais eficaz de participar plenamente da dinâmica capitalista mantendo uma aparência de saúde mental.

Na visão do budista, a exuberância da riqueza financeira mundial é ilusória, apartada da realidade objetiva: o sofrimento humano engendrado pelas transações operadas nas salas dos mercados e conselhos administrativos invisíveis para a maioria de nós. Que melhor prova do caráter não substancial da realidade do que uma gigantesca fortuna que pode se reduzir a nada em poucas horas? Por que deplorar que as especulações sobre os mercados sejam “apartadas da realidade objetiva” quando o princípio fundamental da ontologia budista enuncia que não há “realidade objetiva”?

Por conseguinte, o que nos resta a fazer é renunciar ao nosso desejo para adotar uma atitude de paz interior. Não é de surpreender que um tal budismo-taoísmo possa funcionar como complemento ideológico da globalização liberal: ele nos permite participar do esquema mantendo uma distância interna... Capitalistas, sim, mas desapegados, zen...”