O peditório do Banco Alimentar contra a Fome correu bem.
Ainda bem.
Esta organização sempre foi muito acarinhada cá na família,
com doações e respeito.
As já célebres declarações de Isabel Jonet que, aos meus
olhos, não foram nada infelizes mas completamente genuínas, fizeram abanar os
alicerces do afecto e empatia.
Afinal, as ideias dela nada tinham que ver com as minhas; eu
pensava que o Banco era uma organização movida pela solidariedade e fiquei a
perceber que o combustível era a caridade.
Nunca fui adepta da caridade, mas respeito-a como um pilar da
fé católica – cada um gosta do que gosta.
Nestes tempos difíceis, é preciso acorrer a quem não tem
comida no prato e por isso nem me passa pela cabeça deixar de o fazer. Tenho,
porém, o direito de participar como e com quem eu quiser, e decidi ser
preferível fazê-lo com quem nunca quis parecer aquilo que não é. Refiro-me à
Igreja, através da sua organização Cáritas, que faz um trabalho que em nada
fica a dever ao Banco, só que em surdina, sem happenings bianuais.
Assiste-me ou não o direito de escolher a companhia para
atravessar o pântano? Entendo que sim, e por isso acho triste ver um certo
fanatismo alarve, beato e leviano vertido para texto, como neste caso:
“Ser solidário é importante.
...e não se preocupem com a maltinha bem-pensante que
vos vai dizer que ajudar o Banco Alimentar (eles dirão "tia Jonet") é
fazer caridadezinha.
De facto, eles estão mais preocupados em ser coerentes
com o próprio e adorado umbigo e é gente que nunca deu nem dará nada a ninguém,
nem um beijo, nem um abraço, nem a ponta de um corno, nem nada...” (retirado
do Facebook)
Pensar pela própria cabeça e fazer escolhas de acordo com
as convicções de toda uma vida parece transformar-nos em “bem-pensantes”, termo
sempre usado com enorme carga negativa, e, simultaneamente, nuns estupores que
nunca deram nada a ninguém.
Se é costume dizer que as acções ficam com quem as
pratica, eu acrescento que as palavras desnudam quem as profere − seja a Isabel
Jonet na televisão ou um cidadão anónimo no Facebook.
É por isso que elas, as palavras, são tão perigosas.