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sexta-feira, novembro 23, 2012

Hard times

 
No degrau da porta ao lado da escola profissional está sentado um adolescente, isolado dos outros, com os braços cruzados sobre os joelhos e a cabeça escondida sobre eles.
 
Pergunto-me: estará com dor de cabeça, com sono, com problemas domésticos, mal de amores, a ressacar qualquer coisa, caiu-lhe mal o almoço? Ou terá FOME?
 
Há não muito tempo, e desde há muitos anos, tal hipótese nunca se me poria, pelo menos ali, onde o presenciei.
Mas ontem, literalmente, estoirou-me na cabeça com um misto de espanto, pânico, possibilidade e repulsa.
 
Não estava preparada para isto, e julgo que nunca estarei.
Porque não posso, e também não quero.
 
Nota: imagem roubada ao blogue Delito de Opinião


quarta-feira, outubro 03, 2012

Que se lixe a troika – um livro

FOME, de Knut Hamsun (1859-1952), Prémio Nobel da Literatura em 1920, é um livro soberbo. Na edição da Cavalo de Ferro, tem um longo prefácio de Paul Auster, que quase me fez desistir da leitura; não por ser mau, ao contrário, mas por achar que me ia mete com um louco, e estar farta deles.

Romance quase sem história nem personagens (apenas o narrador) conta-nos os dias difíceis dum aspirante a escritor na cidade de Kristiania, actual Oslo.

Na mais negra miséria, o jovem deambula pela cidade, para cima e para baixo, ou em círculos, escreve, ou tenta escrever, gela e alucina quando possuído pela fome de vários dias, descrita duma maneira tão vívida que dá medo.

As suas atitudes desconcertantes, pautadas por juízos pouco lógicos para quem está em tão terrível situação, fazem-nos, por vezes, pensar que está alienado, que busca a morte. Falso.

O instinto de sobrevivência acaba por falar mais alto, talvez porque o narrador tenha terminado a busca de identidade, e o teste aos limites, através da mais dolorosa das experiências físicas – a fome.

Livro publicado em 1890, não podia ser mais moderno; e o facto de o homem ter sido simpatizante nazi, aquando da ocupação da Noruega, não retira nem um pouco de valor à obra.