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segunda-feira, março 24, 2014

João Tabarra e o abismo















João Tabarra é um artista visual nascido em Lisboa em 1966.
Tem, portanto, 48 anos, e tem também agora, no CAM da Gulbenkian, uma exposição que eu ainda não vi.
Mas li o extenso artigo,de duas páginas, que  escreveu sobre o filme “Fúria de Viver”, e que o Ípsilon de 21 de Março generosamente (?) lhe publicou.
Digo “generosamente” porque dir-se-ia estarmos perante um texto de amador, caso não se soubesse que o seu trabalho inclui a escrita sobre cinema em revistas da especialidade.
Tendo por base as experiências dos seus múltiplos visionamentos do referido filme, aproveita para escrever algumas trivialidades contra a iliteracia, a decadência intelectual do país, as horríveis pipocas no cinema, e também algumas considerações pessoais e existenciais.
Tudo muito levezinho e superficial, assim tipo blogue.
Sobre o 25 de Abril escreve “Sabemos hoje que este foi o mais efémero de todos os sonhos, se é que o chegou a ser, destruído pela chegada dos políticos e pela apressada organização dos seus jogos de poder”.
Ora, então, cá está a “conversa de taxista” pela pena do respeitável artista.
Tendo o 25 de Abril chegado quando Tabarra tinha 8 anos, e sendo de família modesta como afirma, apetece-me perguntar-lhe quem terá criado, neste país, as políticas que permitiram tratar-lhe de borla as amigdalites ou o sarampo, o vacinaram de borla, lhe proporcionaram desporto de borla se o quisesse, e estudos de borla até que quisesse?
Quem terá, afinal, criado as políticas que lhe permitiram ser muito daquilo que hoje é, a custo  mais ou menos zero para a sua família de origens modestas?
Talvez tenham sido os políticos que João Tabarra despreza tão global e levianamente; desresponsabilizar-se, não fazer distinções, crucificar os políticos tout court é conversa de taxista, sim.
Lá mais para o final do artigo, conta o artista que a última vez que reviu o filme foi no dia 7 de Agosto, e escreve: “Notei muitos outros pormenores cinematográficos em que não tinha reparado antes, daqueles que é melhor deixar para os autoproclamados especialistas…”
Eu não percebo muito bem onde ele quer chegar.
Notar “pormenores que é melhor deixar para os autoproclamados especialistas” quer dizer exactamente o quê? Então ele não é especialista? Parece que é! Então e não viu antes? Mas, afinal, viu depois? E porquê autoproclamados?
Não tenho a certeza, mas parece-me que, depois de tão claramente demonstrar desgosto pela miséria intelectual a que chegámos, também João Tabarra cai no abismo, e mostra que não tinha imunidade a um vírus, altamente patogénico, que por aí circula, e que é causador de muita da nossa actual miséria intelectual – aquele que despreza, e até hostiliza, os que aprofundam conhecimentos em campos de estudo subjectivos.
Ele chama-lhes “autoproclamados especialistas”, o vulgo chama-lhes pseudo-intelectuais. É uma praga.
Terei que ir ver a exposição de João Tabarra. Talvez goste mais do seu trabalho do que das suas ideias, quem sabe.
 
Nota: artigo disponível aqui