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quarta-feira, junho 24, 2015

Do lado certo do betão










 
 
 
 
 
 
Poucos anos depois de eu nascer, a Europa do pós-guerra acordou um dia com a construção de um muro em Berlim.

O mundo ocidental chamou-lhe “Muro da Vergonha”.

Com ele cresci e vivi até 1989, data em que o muro foi derrubado pelos povos de leste e todos, no leste e no oeste, achámos que iríamos viver tempos de paz, liberdade e prosperidade.

Não foi o que aconteceu, como muito bem sabemos hoje, mas a minha mais recente perplexidade resulta da tomada de conhecimento da construção de novos muros: a Hungria constrói um muro de 175 quilómetro de comprimento por quatro de altura, ao longo da sua fronteira com a Sérvia, para impedir a entrada de clandestinos, e a Bulgária constrói uma cerca ao longo de toda a linha fronteiriça com a Turquia, junto à cidade búlgara de Lesovo, para impedir a entrada de refugiados. O primeiro trecho, com cerca de 32 quilómetros, ficou concluído em Setembro.” (aqui e aqui)

Afinal, na Europa, e segundo percebo:

a) os muros só são da vergonha se construídos por comunistas;
 
b) também não é vergonha nenhuma os pobres enxotarem os miseráveis;

c) os muros, para estes povos tantos anos subjugados por um, até são, afinal, uma forma expedita de resolver problemas, desde que consigam ficar do lado certo do betão

segunda-feira, maio 12, 2014

Isso é que era!









 
 
 
 
 
 
 
Sonolenta reflexão numa tarde de domingo:

A minha geração, quando as coisas não corriam bem no país, sentia que tinha o DEVER de as tentar mudar. E tinha.

A geração a seguir à minha, quando as coisas não correm bem no país, sente que tem o DIREITO de se ir embora. E tem.

E então? Moral da história?
Bom, isso não sei; se calhar nem tem.

Também nem sei por que me pus a pensar nestas parvoíces em vez de tentar perceber se a barba do tavesti que ganhou o festival da canção é real ou pintada.

Melhor ainda seria começar a alertar as redes sociais, que ainda não perceberam nada, para o facto de a victória do travesti barbudo ser parte integrante do pacote de sanções da Europa à Rússia.

Isso é que era! Mas afinal acabei por passar pelas brasas.

quarta-feira, abril 30, 2014

Eu tive um sonho



 
Já o tive de outras vezes e agora voltou, certamente pelo que vou ouvindo nas notícias − eu queria ver os finlandeses na merda.

Lá, teriam que repetir indefinidamente: a Europa é um projecto solidário!

Como julgo que iriam perguntar “o que quer dizer solidário?”, exigiria que dissessem muitas e muitas vezes até aprenderem o significado:

Que tem interesses e responsabilidades mútuas.

Era só isso. Um sonho simples, como se vê.

quinta-feira, junho 13, 2013

O Mediterrâneo já está a arder?


 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Espanha, Itália, Grécia, Chipre, Turquia, Síria, e Portugal mais ao lado.

A brutalidade do que está a acontecer aos povos destes países faz pensar que estamos diante do desastre bíblico dos tempos modernos.

Num mesmo dia, vi o governo grego fechar a rádio e a televisão públicas, Erdogan não olhar a meios bélicos para retirar os turcos em protesto da praça Taksim, e o nosso pequenino Crato, que tem pena de não ser um Samaras ou um Erdogan a afiar os dentes, qual lobo esfaimada, contra os professores.

Ninguém dialogou, ninguém negociou, ninguém quer conversar. São todos ditadores, legitimamente eleitos (onde é que já ouvimos isto?), ao serviço dos credores, das troikas, dos seus projectos pessoais de poder, ou da religião.

Se algum dos políticos europeus se lembrar de perguntar “O Mediterrâneo já está a arder?” a resposta é, indubitavelmente – SIM.

O fogo está, por agora, circunscrito, mas ameaça ficar fora de controlo a qualquer momento. Acresce que, devido às medidas de austeridade na Europa, os bombeiros foram despedidos.

Sem combate às chamas, e com a barreira do mar a Sul, o fogo dirigir-se-á, inexoravelmente, para Norte, e a Europa corre o risco de ser engolida pelas chamas.

O Mediterrâneo já está a arder.

Nota: a fantástica imagem ali acima foi encontrada no Facebook, postada pela página Reflections on a Revolution, dedicada aos acontecimentos na Turquia, e tem com legenda em inglês:

If even grandma is attacking you, you definitely know you're on the wrong side..

quinta-feira, abril 11, 2013

Uma casa chamada Europa

 
 
Então, é assim que, hoje em dia, eu vejo a Europa e a sua construção.
 
Era uma casa muito engraçada
Não tinha tecto, não tinha nada
 
Ninguém podia entrar nela não
Porque na casa não tinha chão
 
Ninguém podia dormir na rede
Porque na casa não tinha parede
 
Ninguém podia fazer pipi
Porque penico não tinha ali
 
Mas era feita com muito esmero
Na rua dos bobos, número zero
 
A Casa
Vinicius de Moraes


segunda-feira, dezembro 10, 2012

Barroso Twist, um contorcionista português

Há dez anos, foi como a foto mostra – Barroso Twist a fazer de porteiro aos três delinquentes que nas Lajes, nesse dia, decidiram a invasão do Iraque.

Hoje, Barroso Twist, ou o grande contorcionista português, igualmente bem acompanhado, vai receber em Oslo o Prémio Nobel da Paz, atribuído à Europa.

Do trio de presidentes (Barroso, presidentes da Comissão Europeia; Herman Van Rompuy, presidente do Conselho Europeu e Martin Schulz, presidente do Parlamento Europeu), dois não foram eleitos por ninguém. A Europa que eles representam, por sua vez, que já foi o território da esperança de milhões de homens e mulheres tem hoje 120 milhões de pessoas em risco de emergência social e 26 milhões de desempregados.

Uma verdadeira fábrica de fazer pobres em permanente laboração.

Barroso, Rompuy e Schultz são três bostas, dignos representantes da bosta que criaram.
Vou desligar a televisão. Esta não é a minha Europa e eles não me representam.

Quanto à Academia Sueca, depois de velha virou prostituta.
Como se pode ver, hoje a minha tolerância resolveu não se levantar.


sexta-feira, agosto 10, 2012

Uma grande ilusão?

Europa, Europa, Europa.

Agora que o velho continente se apresenta incontestavelmente velho e em perigo de colapso total; agora que o velho continente é governado por gente que não viveu a guerra, que não tem memória (na melhor das hipóteses) ou que nunca estudou história (na pior), aí está este ensaio de 140 páginas escrito por Tony Judt em 1996 sobre a Europa e a construção europeia.

“Uma grande ilusão?” – Um ensaio sobre a Europa, é factual e sem romantismos ideológicos, fácil de ler, quase didáctico.

Excelente para ser lido por quem sabe mas não se importa de recordar, mas sobretudo por quem não sabe mas gostava de saber como tudo começou e se desenrolou até 1996.

Não se busquem perspetivas sobre a situação actual, porque o euro (o centro do furacão) ainda nem sequer tinha nascido, mas não se pode compreender totalmente o presente sem termos uma luz sobre o passado.

Uma óptima leitura para quem também gosta de não-ficção.

Edições 70, Junho 1012

sexta-feira, maio 25, 2012

Merkel com dores nos pés

Frau Merkel nasceu, cresceu e tornou-se adulta na ex-RDA, e isso não acontece impunemente. A minha geração também nasceu, cresceu e tornou-se adulta sob uma ditadura.

Porém, a minha geração lutou contra a ditadura, o que não me lembro de ter acontecido com a dela. Enquanto por aqui se organizaram lutas colectivas que abanaram o regime, a dissidência da Merkel limitou-se, segundo li há tempo numa entrevista, a conseguir não integrar a Stasi argumentando que era incapaz de guardar um segredo.
Mulherzinha esperta!

A sua fixação no défice zero, e na “casa arrumada” fazem-me pensar que o que ela acharia mesmo bom era um plano quinquenal para a Europa, controlado por ela mesma, com atribuição de medalhas, não ao trabalhador do ano, mas ao país do ano.
Aos alemães vendeu a receita das contas certas e castigo para quem o não conseguir, sem mais explicações, e eles compraram. Passaram todos até a dizer em coro que o óleo de fígado de bacalhau da chanceler era um muito bom óleo de fígado de bacalhau.

Agora que o discurso na Europa está a mudar, ainda que muito ligeiramente, e a senhora percebeu que vai ter que vender um produto um pouco diferente ao seu povo, começa a sentir um apertozito nos calos e precisa de “descalçar a bota”.

Segundo o JN, Merkel já ontem afirmou em Berlim:
“…a fragilidade de países parceiros do euro acabará por concorrer para a fragilidade da Alemanha. Citada pela Bloomberg, Angela Merkel disse, em Berlim, que a Alemanha só pode ser forte se os seus vizinhos estiverem bem.” (notícia aqui)

Ainda a ouviremos dizer muitas outras coisas, e não sei se vai conseguir “descalçar a bota”, mas lá que ela está com dores nos pés, lá isso está.
O que, não sei porquê, me provoca uma inusitada alegria.

quinta-feira, maio 17, 2012

O touro e o gato

Há dias em que até o mais incréu dos incréus precisa de se convencer de qualquer coisa. A tão apressada visita do Hollande à Merkel provocou à minha volta comentários do tipo – vai ao beija-mão! servilismo!

Eu, em abstrusa fase de increia com fé, preferi pensar que senhor estava com pressa de dizer várias coisas à alemã, como por exemplo: que o eixo franco-alemão é importante mas que a capital da Europa é Bruxelas e não Berlim, que precisamos de mais democracia interna e que esta história de serem só dois a mandar está a deixar alguns povos europeus exasperados, que é preciso defender a Grécia “custe o que custar” antes que a Europa comece a apodrecer das bordas para o centro, que isto de castigar os que estão na mó de baixo já deu mau resultado se ela bem se lembra de Versalhes (será que estudou isso?), que precisamos de repor o modelo europeu e não importar o chinês etc. e, assim, decidi acreditar que ele não ia apenas ao beija-mão.

De facto, não sabemos o que se passou entre eles, mas imagino que tenham sido dois animais, com polimento civilizacional, a medirem-se um ao outro, dado que não se conheciam.
Sabemos que a Merkel é um touro (evito aqui o feminino por decoro) mas ainda não sabemos que animal será Hollande.

Contudo, no Público de ontem, cita-se uma jornalista francesa que escreveu:

“…Hollande parece-se como esses gatos (espertos e indecifráveis) que teimam em vir enroscar-se nos sofás proibidos. Impõe a sua vontade à força de insistência, de sorrisos e de obstinação.”

Que a assim seja, desde que a sua vontade seja uma boa vontade e ele não perca demasiado tempo com salamaleques; é que o touro, se puder, não perderá a oportunidade de lhe dar uma valente cornada.

quinta-feira, abril 26, 2012

Rasgar a apólice chega?

Nunca fui simpatizante de seguros e seguradoras. Posso mesmo dizer que, nesse aspecto, sou ferozmente desconfiada, a ponto de sempre dizer que, à cautela, prefiro ser eu a fazer o mealheiro.

Quando em 1986 aderimos à então chamada CEE, pela primeira vez achei que não seria má ideia fazer aquele “seguro”, coisa mais do tipo mutualista em que os subscritores eram solidários entre si. Pensei também que, por via dessa solidariedade, talvez nos fossemos aproximando dum melhor padrão de vida que existia lá nos outros países subscritores.

Como toda a gente faz, não li as letras pequeninas da apólice.

Esta, afinal, não cobria riscos sísmicos (financeiros) nem inundações (mesmo que todos metessem água), o mutualismo só estava previsto na bonança, e caso o padrão de vida resvalasse para o tipo africano ficava implícito que cada um devia tratar de si.

Concluo, portanto, que a minha desconfiança em relação às seguradoras continua a ter razão de existir, e que é imperioso ler as letras pequeninas.

Muito gostaria de acabar com este seguro que, para além de não me “segurar”, nem sequer me deixa vender as pratas e o ouro dos antepassados para pagar as dívidas.
Como é que faço? Basta rasgar a apólice?


quarta-feira, abril 18, 2012

Uns “vizinhos” com sorte

Tomei conhecimento de que a comissão Europeia abriu um processo contra Portugal por causa das condições de vida de metade das nossa galinhas poedeiras.
Elas não têm o conforto exigido pela Europa, que determina que as gaiolas têm de prever para cada galinha, pelo menos 750 cm² de superfície da gaiola, um ninho, uma cama, poleiros e dispositivos adequados para desgastar as garras, que permitam às galinhas satisfazer as suas necessidades biológicas e comportamentais". Notícia aqui

Eu acho muitíssimo bem.
Entretanto, só por curiosidade, fui deitar uma olhadela, à socapa, a dois sem-abrigo que são muito cá do sítio, para verificar se as condições em que vivem são "capazes de satisfazer as suas necessidades biológicas e comportamentais".

Verifiquei que, quando deitados, ocupam mais de 750 cm2, porém, não vi cama e muito menos poleiro. Quanto ao “dispositivo adequado para desgastar as garras” também não me parece que exista, dado o estado em que as mesmas se encontravam.

Os meus dois “vizinhos” agradecem à Europa que só se preocupe com os animais. É que parece que teremos de abater as galinhas que não têm condições de vida decentes.
Sorte a deles, hem?

Posto isto, os amigos e defensores dos direitos dos animais podem chamar-me os nomes todos que quiserem.

quarta-feira, dezembro 07, 2011

As nossas desculpas, Sr ª Merkel

Parece que é nos próximos dias que os do costume vão “refundar” a Europa e o euro. Se não resolverem adiar, como também é de costume, diz-se que o caminho da refundação já está mais ou menos traçado – mais austeridade, mais chibatadas nos malcomportados, policiamento atento desses “marginais” e castigo exemplar se pisarem o risco novamente.

A Merkel diz: estas são as minhas regras e quem não quiser pode ir morrer longe.
Eu não quero ir morrer longe, preferia morrer por aqui mesmo, e até gosto da Europa e de ser europeia. Por isso, antes que eles comecem a distribuir chibatadas, e na esperança de atenuar o castigo, quero pedir desculpa à senhora Merkel.

São muitas as faltas, eu sei, mas quero pedir desculpa, em nome de toda a classe média portuguesa, por nos últimos trinta anos termos comprado carro com o mesmo entusiasmo com que os americanos compraram o seu Ford T no princípio do século XX; por acharmos que tinhamos que morar em algum lado e termos comprado um T2 nos subúrbios com uma mensalidade que até era menor que qualquer arrendamento; por termos aceitado as “prendas” que o banco juntava à casa; por termos comprado mais uma televisão para a cozinha; por termos comprado dois pares de botas para o inverno, em vez de um só; por termos provado sushi e muffins; por termos ido tratar os dentes no dentista privado; por termos comprado vacinas “supérfluas” para as nossas crianças; por termos experimentado andar de avião para gozo de oito dias de férias na Tunísia; por termos ligado mais aquecedores em dias muito frios; por termos comprado aulas de música, ou de arte ou de informática ou de inglês para os nossos filhos; por gostarmos de ir à Fnac e, de vez em quando, cairmos na tentação de comprar um livro ou um CD; por em 2010 termos ido ao teatro para lá de 1 milhão e oitocentas mil vezes.

Por tudo isto, e mais umas quantas parvoíces que fizemos, peço desculpa.
Disseram-nos que éramos europeus e quisemos saber como era isso. Foi um erro, está visto, gastámos demais e vamos voltar a ser pobrezinhos mas honrados como o Dr. Salazar gostava.

Também nos disseram que “…a Europa foi construída com base na solidariedade e não da submissão dos fracos aos poderosos”. (editorial do Expresso de 3 de Dezembro), e nós acreditámos, tontos que somos.
Pedimos desculpa, senhora Merkel, mas pode ter a certeza que o fazemos com “uma raiva a nascer nos dentes”.
E isso, não sei porquê, não me parece um bom sinal; nem para si, nem para nós.

quarta-feira, novembro 23, 2011

A casa de correcção

Amanhã é dia de Greve Geral. Geral não será certamente. É a greve dos trabalhadores que, de alguma forma, trabalham para o Estado.
Os privados não farão greve, o comércio não fechará, os trabalhadores por conta própria… tomara que tenham trabalho.

Aos poucos, mas ao longo dos anos, o poder tem criado as condições para não haver condições de fazer greve, por muito descontentes que estejamos. O trabalho precário, os recibos verdes, o trabalho a prazo, os contratos individuais, são poderosas ferramentas para desincentivar qualquer tipo de manifestação grevista.

É verdade que, amanhã, 15% dos portugueses impedirão os outros 85% de trabalhar, mas a greve, em abstracto, é ainda um dos direitos que nos liga à democracia tal como a conhecemos até aqui, e que pode estar a mudar.

Num excelente artigo do Atual de 19 de Novembro, com o título O Rapto da Europa, António Guerreio escreve sobre dois livros – de Hans Magnus Enzensberger e Jurgen Habermas.
Estes autores analisam a forma como a Europa foi raptada por “funcionários esclarecidos” que em Bruxelas tudo regulamentam, desde a coloração dos alhos franceses e a curva máxima do pepino, até às lâmpadas ecológicas de uso doméstico cujo regulamento ocupa 14 páginas.

Os livros abordam aquilo a que chamam a Europa pós-democrática. Já não se trata de défice democrático, que pressupõe um desvio ou uma insuficiência como analisa António Guerreio, mas da “entrada num outro modelo que ainda não sabemos designar senão como inflexão, historicamente determinada, da democracia”.
Nesse modelo, segundo Enzensberger, “ não se está a construir uma nova prisão para os povos, mas uma casa de correcção”.

Ora, se nessa casa de correcção os” internados” se atirarem uns aos outros, discutindo acaloradamente se é ou não “correcto” fazer greve, por exemplo, quem sairá a ganhar é o detentor do poder, que assegurará a ordem, reforçará a repressão hard e soft e, no fim, terá alcançado os seus objectivos.

Eu acredito que estamos a iniciar o caminho pós-democrático, e que seria bom que reflectíssemos sobre o papel que cabe a cada um de nós nesse novo e desconhecido quadro organizacional.

sexta-feira, novembro 18, 2011

Pataniscas com arroz de feijão

Em Lisboa há imensos cafés e restaurantes “de esquina”. Essa localização leva-nos a reparar mais neles de cada vez que atravessamos uma rua. Ontem, passei por um que, na porta, anunciava Pataniscas com Arroz de Feijão.
Pode haver comida mais portuguesa do que essa? E quem resiste a tal pitéu na hora da fome?

Comida barata, ainda por cima - um bocadinho de bacalhau, água da cozedura, farinha, um ovo, um pouco de salsa e já está. Arroz e feijão também sempre foram comida de pobre.

Na minha terra (como noutras, certamente) aprendeu-se a cozinhar e comer com base em ingredientes muito baratos ou até selvagens. Hoje, a sopa de beldroegas ou de cação, os cardos com feijão, as cilarcas, as açordas de poejos ou coentros e as migas são realíssimos pitéus, um verdadeiro património que nos faz “aguar” e de que nos orgulhamos.
Qual nouvelle cuisine, qual carapuça? Migas de espargos com porco frito.

A criatividade gastronómica de cada povo, a sua capacidade para fazer muito ou pouco com o que tem ao seu dispor, diz-me muitíssimo sobre esse mesmo povo, e quer-me parecer que, se actualmente os nossos “manos” europeus desconfiam tanto de nós, é porque nunca comeram pataniscas com arroz de feijão.

quarta-feira, novembro 02, 2011

Ir e vir

Quanto fechei a porta pensei: que bom, uns dias fora, ainda que poucos, sem Merkel, Sarkozy, Trichet, Passos e Gaspar. Enfim, uns dias sem Europa nem Portugal.
Quando abri a porta, pensei: que bom é viver na Europa, mesmo quando ela se vê grega.

Podemos e devemos reclamar com o presente, mas o que se conquistou e a nossa forma de vida são bens inestimáveis pelos quais valerá sempre a pena lutar.
Sair, ajuda a pôr em perspectiva as brigas que por aqui vamos cobrando, o nosso mal-estar mas também o nosso bem-estar. A Europa continua a ser a melhor parte do mundo para se viver, e um porto de abrigo que milhares procuram pondo em risco a própria vida
.
A Europa é uma invenção em permanente construção e é fascinante viver num tempo que nos permite ver como ela anda para a frente ou às arrecuas, cai, tropeça, levanta-se, nunca corre mas continua a andar.
Toda a construção pode ruir, é certo, sobretudo se é pioneira e inovadora como esta. Com todos os seus defeitos, o menor dos quais não será a pouca democracia usada nas decisões, continuo a pensar que vale a pena continuar a pôr tijolos e argamassa numa construção que se quer sólida mas se exige harmoniosa.

Que pensarão os gregos?
Se a Grécia foi o nosso berço no passado, eis que agora volta a ter em mãos muito do nosso futuro comum.

terça-feira, setembro 20, 2011

Muitas perguntas e uma resposta (torta)

No seu blogue 2 Dedos de Conversa, Helena, que vive na Alemanha, publicou no dia 18 de Setembro, um post com o título “não é preciso que tenham pena dos alemães, mas…”, em que escreve a determinado momento:

Entretanto a notícia do dia é esta: se as coisas correrem mal, pode ser que os contribuintes alemães tenham de entrar com 465 mil milhões de euros para salvar o euro. Em dinheiro vivo, se bem entendi.

Fiquei a pensar que isso não é nada comparado com os 1,3 biliões de euros que já custou a reunificação alemã.
E pergunto:
O resto da Europa não contribuiu para essa pequena despesa da Alemanha? Foi toda paga pelos alemães ocidentais?
“Salvar” 18 milhões de alemães de leste é mais importante que salvar todo um continente belicoso com 500 milhões de indígenas?
E pergunto ainda:
Quem construiu o euro à sua medida? Foi Portugal? Foi a Grécia? Ou terá sido a Alemanha?
Não admitiu já o presidente do BCE que se tem andado sempre a fazer com o euro e as taxas de juro o que convém à Alemanha e à França?
Quem, verdadeiramente, lucrou com o euro até agora?
E ainda faço outra pergunta:
Não é a direita, que está no poder em quase toda a Europa, que defende sempre o princípio do “Utilizador/Pagador”?
E agora não pergunto, respondo:
Se é essa a máxima, cumpra-se.

quarta-feira, setembro 14, 2011

Protectorado e seu protector

Percorrendo os títulos dos jornais de 13 de Setembro

Um protectorado chamado Portugal:
- Troika quer medidas adicionais de corte na despesa equivalentes a 0,6% do PIB em 2012- Público online
- Troika adia reforço do poder dos reguladores para final de 2012 - Público online.
- Técnicos da troika em Lisboa para discutir redução da Taxa Social Única – Público online.
- Governo disponível para tomar mais medidas de austeridade - JN online
- Carlos Moedas: "Vamos enfrentar mais dificuldades" – JN online
- Troika avisa que Portugal está em falta na TSU - Expresso online

O protector tem a casa a arder e recusa chamar os bombeiros:
- Risco de default da Grécia salta para 98% - Público online
- Juros da dívida grega a dois anos ultrapassam os 90% . Público online
- Merkel recusa insolvência descontrolada da Grécia – Público online
- Grécia diz que só tem dinheiro até Outubro - Público online
- Obama diz que Espanha e Itália são o “maior problema” da zona euro Público online
- Europa está "à beira do precipício", diz Felipe Gonzales - Expresso online

Nem sei se deva começar já a deprimir ou se espere mais um pouco para quando cairmos no precipício.
Acho que espero. O antidepressivo só perde a validade daqui por seis meses.

quinta-feira, agosto 11, 2011

Nem preto, nem branco

A blogosfera e os jornais estão cheios de comentários sobre os acontecimentos de Londres. Para uns, os jovens devem ser desculpados porque a culpa é do “sistema”; para outros, são pura e simplesmente uns criminosos, desordeiros e ladrões.
Como se sabe, nada é só preto ou só branco e por isso eles são criminosos, desordeiros e ladrões, sim, mas o “sistema” também tem a sua dose de culpa.
Alguns serão toda a vida apenas criminosos, desordeiros e ladrões, porque essa é a sua natureza, e há disso em todo o mundo, outros serão apenas fruto dum multiculturalismo falhado, dum capitalismo de casino e sem vergonha, de políticas em que o futuro e a esperança não entram.
Por isso repito: a Europa deve estar preocupada com a selvajaria mas também com a raiva que nidificou no seu seio. E se não pode, de todo, viver sem os emigrantes (e as suas 2ª e 3ª gerações) tem que cuidar deles como dos seus.
O que aconteceu em Londres foi aterrador, com muitos protagonistas destituídos de quaisquer normas de conduta ou cidadania mas, por todo o mundo, jovens com causa saem à rua e enfrentam o poder, como está a acontecer no Chile ou em Israel.
Sim, o futuro já não é o que costumava ser e a insegurança e falta de perspectivas generalizadas só podem tornar cada vez mais frequentes cenas como as que vimos em Londres, pregados à cadeira em frente ao televisor.

quarta-feira, agosto 10, 2011

quinta-feira, maio 26, 2011

Refugiados

Fome, miséria, falsa fé, vingança e medo, parecem ter tomado conta do mundo.
Aqui bem perto, o Mediterrâneo, geralmente tão aprazível e carregado de história, transformou-se num mar de morte, indiferença e medo.
Pessoas que fogem da Líbia e duma guerra apadrinhada pela União Europeia, bem como os pobres da África subsariana que fogem da fome, morrem aos milhares nas águas do Mediterrâneo na tentativa vã de chegarem à Europa. Esta, tolhida pelo medo e egoísmos vários, preocupada apenas com o processo eleitoral que se segue, fecha a porta e atira a chave ao mar.
Nós, cidadãos europeus, aconchegados na nossa indiferença, deixamos que morram.
Os países da Europa do sul têm fortes tradições de emigração – portugueses, espanhóis, e italianos estão espalhados pelo mundo e sabem, com um saber de experiência todo feito, que ninguém emigra por gosto, apenas por desespero.
Não se trata de deixar entrar milhões a quem também não poderíamos dar vida digna por cá; trata-se apenas de encontrar forma política e material de ajudar.
Porém, à luta corajosa destes homens e mulheres por uma vida mais digna, ou apenas pela sobrevivência, respondemos com aquilo em que nos tornámos bons - arrogância e indiferença.
Com tais traços de caráter, a Europa/fortaleza vai secar tanto que, quando morrer, já será múmia. Nem sei se não o será já; pelo menos coração já não tem.