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quarta-feira, outubro 10, 2012

Vivendo com a diferença

Ainda gosto de a recordar menina.
Baixinha, viva, olhos verdes e míopes, vaidosa, leitora compulsiva, parecia uma bailarina de caixa de música posta a tocar para que mostrasse graciosas habilidades.
O auditório familiar sonhava sonhos grandes para ela, menina com brilho extra, leitora precoce de Althusser e Rosa Luxemburgo.

Quando, adolescente, sobreveio o breackdown, e que raio seria isso, foi como uma bala no meio do peito do embevecido público. Havia de passar, havia de se curar.
O tapete vermelho passou a rampa de perigoso ângulo, resvalando para as alucinações, o real imaginário, os imprevisíveis humores, a esquizofrenia.
Como se um espírito mau tivesse puxado o fio do tricô tão laboriosamente tricotado, este começou a desfazer-se em brigas de amor-ódio, agressões verbais, fugas, relações cada vez mais perigosas com a vida, e lenta implosão familiar.

Nos dias bons, parodiava-se a normalidade, nos dias maus encetavam-se buscas ansiosas em pensões sórdidas da Baixa onde nunca estava só, e nem sequer aparecia, mas mandava recado, dizendo que ainda não era tempo de voltar para casa. Iniciava-se então o regresso, com uma dor que não devia ser permitida a nenhuma menina, para informar que parecia que sim, que estava viva, mas não se sabia dizer quanto.

Havia de passar, havia de se curar. E o plano inclinado cada vez mais íngreme, escorregadio e imprevisível.
Mas ainda gosto de a recordar menina.

 
PS: hoje é Dia Mundial da Saúde Mental