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quarta-feira, maio 08, 2013

Ler













Considero-me uma razoável leitora, mas não sei quanto livros leio por ano.

Uns são grossos e outros finos, uns são fáceis e outros não, o que torna a “coisa” certamente muito variável; além do mais, a contabilidade é ramo do saber que não me entusiasma.

Uma coisa, porém, de há muito eu sabia – o meu conhecimento da literatura de Espanha é altamente deficitário.
Retirando o Vila-Matas, de quem até li duas ou três obras, o resto era um imenso buraco negro de ignorância.

Vai daí, pedi a uma amiga que me emprestasse três livros de escritores espanhóis. Ela escolheu (e, logo nessa escolha, dois terços eram catalães), e emprestou-me:
“O Prémio” de Manuel Vázquez Montalbán
“Beatus Ille” de Antonio Muñoz Molina
“A Sombra do Vento” de Carlos Ruiz Zafón

Ocorre-me dizer que pronto, está bem, tomei conhecimento.
Eles contam muitas histórias, e eu até gosto de histórias bem contadas mas aquilo, de facto, não é a minha praia.
A minha praia é, por exemplo, ao terceiro parágrafo dum livro, topar com isto:

“ A história faz-se de anseios em grande escala. Trata-se de um mero garoto com um desejo bem restrito, mas faz parte de uma multidão que não cessa de engrossar, milhares de indivíduos anónimos que emergem dos autocarros e dos comboios, pessoas em colunas estreitas que calcorreiam a ponte giratória sobre o rio e, embora não formem uma migração nem uma revolução, um vasto abalo de alma colectiva, trazem consigo o calor do corpo de uma grande cidade e os seus próprios devaneios e desesperos insignificantes, essa coisa invisível que assombra o dia – homens de chapéu de feltro e marujos de licença, o tropel caótico dos seus pensamentos, a caminho duma partida de basebol.”

Don DeLillo
Submundo
Sextante Editora

Cumprida uma daquelas obrigações que inventamos para nós mesmos sem saber porquê, congratulo-me por ali na prateleira, escolhidos por mim e à minha espera, estarem livros de Philip Roth, Paul Auster, Lawrence Durrell e E.L. Doctorow.

Benza-a Deus, que aquela é uma prateleira que carrega consigo a promessa de muitas horas felizes enquanto não acontece por aqui um vasto abalo de alma colectiva nas palavras de Don DeLillo.

 

 

 

 

quinta-feira, fevereiro 14, 2013

Secretos temores

“A morte, pensou, não é essa fronteira, essa vala imóvel que imaginamos quando acaba de acontecer, mas sim um progressivo afastamento que desemboca no vazio e na deslealdade.”

Antonio Muñoz Molina
Beatus Ille.

Deve ser por saberem isso que as pessoas enchem as casas de tralha contra o esquecimento − fotografias, bibelôs, porcarias trazidas das viagens, catálogos e bilhetes de espectáculos ou exposições, toalhas da avó, candeeiros da tia, flores secas da adolescência, porcelanas da sogra, naturezas mortas da prima que tinha muito jeito.

Deslealdade e vazio são coisas que não temo.
Apenas temo viver, algum dia, no mausoléu da minha própria vida.