terça-feira, fevereiro 28, 2012

Amiguismo, miopia ou apenas humor?

A Sociedade Portuguesa de Autores (SPA) resolveu atribuir a Évora o prémio Melhor Programação Cultural. (Notícia aqui)

Se o prémio tivesse sido atribuído há 15 ou 20 anos, seria bem merecido; em 2012 só pode ser anedota, ou miopia ou amiguismo.

Évora tem sido, na última década, o excelente exemplo dum desastre de gestão autárquica.
Desde que, em 2001 o PS ganhou as eleições autárquicas, começou o desbaratar do património cultural laboriosamente construído durante vinte anos.

O Centro Histórico de Évora (CHE), classificado Património da Humanidade em 1986 foi deixado ao abandono no que constituiu um criminoso assassinato da “galinha dos ovos de ouro”.

Sendo uma cidade essencialmente de serviços, o que tornava aquele Centro Histórico único era a capacidade de preservar o edificado ao mesmo tempo que se mantinha um centro vivo e animado.

Ora, logo que o PS chegou ao poder, tratou de retirar a grande maioria dos seus próprios serviços do CHE, transferindo-os para um barracão que arrendou por uns milhares de euros no Parque Industrial.
Foi o tiro de partida para que muitos outros lhe seguissem o exemplo, conduzindo inexoravelmente à desertificação do CHE.

Hoje, ele é habitado por um punhado de velhos, o comércio definha e, em muitas ocasiões, parece uma cidade fantasma.
O edificado é deixado ao abandono, com inúmeras casa fechadas e sem que para alterar a situação se conheça qualquer plano.

Quanto à programação cultural, que foi pujante nos anos 1980, 1990 é agora escassa e paroquial.

O Cendrev (teatro) tem sido alvo de inúmeras tentativas de “morte matada”, as muitas organizações culturais de menor dimensão foram asfixiadas pela retirada de apoios, o embrião dum museu de arte contemporânea que existia em 2001 foi prontamente abandonado, bem como o festival de verão “Viva a Rua” que já se tinha afirmado a nível nacional. Finalmente, há três anos, fechou o cinema.

Excelência na conservação do património e na programação cultural?
Só dito por ironia.
O sentimento de quem lá vive resume-se nesta história que vi contada no Facebook:

PE foi buscar o filho à estação dos comboios. Quando este parou, uma rapariga saltou para a gare, olhou em volta e perguntou-lhe:
- Aqui é Évora?
Ao que ele respondeu:
- Não menina, aqui é o Desterro.
Amiguismo, miopia ou uma simples anedota?


Nota: foto de rua de Évora já publicada neste blogue num post com o título Notícias da Desolação

5 comentários:

  1. SPA / CME... é o chamado par de jarras! Qual delas terá feito mais pela cultura nos últimos anos... Valha-nos José Jorge Letria que, num rasgo de incomparável lucidez, disse que este prémio "tem um valor essencialmente simbólico"! (Agora tenho que ir ali rebolar-me a rir no chão).

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  2. Já há uns anos largos que aí não vou!
    Fui ainda no tempo da anetrior gestão camarária e tudo... estava no seu lugar!
    Tenho muita pena que me digas que este abandono é real.
    Évora não o merecia.

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  3. Évora tem todas as condições para ser uma referencia cultural nacional, iberica e europeia... assim os poderes tivessem sabido potenciar todos os recursos que lá se juntam (a história, as instituições, a criação, a investigação e a formação)... perdoem-me alguns amigos mas isso nem a cdu soube fazer...

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  4. Caro Anónimo, só lhe posso responder que "Vacas sagradas, não tenho".
    http://1diaatrasdooutro.blogspot.com/2012/01/vacas-sagradas-nao-tenho.html

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  5. Sinceramente a atribuição deste prémio é qualquer coisa de absurdo e só prova a falta de informação da SPA, já que ao que a pouca cultura da cidade de Évora e maioritariamente planeada e executada pelas associações culturais da cidade, ainda que esta teime em extinguir.
    No entanto não acho que a actual gestão do PS tenha feito um trabalho muito diferente da anterior gestão CDU. Sinceramente estamos e vivemos na mesma. Isolados e sem a maioria das vantajens de outras cidades de interior. A falta do cinema é uma delas! Mas quanto sei não podemos apontar armas à CME, já que uma cambada de escória teimou a construção do shopping e seus cinemas.
    Quanto à desertificação do centro histórico, acontece em Évora como em todas as cidades, não é um problema só nosso. Há que saber aceitar evoluir com isso, como fazem Braga e Viseu, por exemplo.

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